sábado, 26 de dezembro de 2009

Pobre Gervásio - Parte 1


"Tira essa escada daí... Essa escada tem que ficar de fora, eu vou chamar o síndico! Tim Maia!"

Caros degustadores de interfaces, esse começo efusivo se deve ao fato de acreditar que só mesmo o saudoso Tim poderia salvar Gervásio. De quebra quem sabe salvaria esse humilde narrador que escreve em hipertexto e fica feliz quando descobre quem são alguns de seus leitores anônimos. Quem é Gervásio? O que ele tem a ver comigo? Como Tim Maia poderia nos salvar? A verdade é que todos esses elementos se encaixam de maneira coerente e talvez eu até convencesse vocês disso, mas antes que isso fosse possível eu sou obrigado a agregar a Rua Ceará nessa mistura toda.

Vou tentar esclarecer. Todas essas coisas me remetem ao assunto invasão de privacidade. Ocorre que estava eu ontem assistindo ao noticiário local e aparece uma reportagem de trânsito falando sobre as retenções na Radial Oeste decorrentes da obra de extensão da linha 2 do metrô. Nesse momento a repórter indica que o melhor atalho para o motorista fugir do engarrafamento é virar a direita e pegar a Rua Ceará... Isso mesmo, a Rua Ceará.



Nesse momento me vem a mente todas as imagens daquelas imediações: bares de motoqueiros, ambiente underground, bares com rock rolando e andando mais um pouco, passou a fronteira tá na Vila Mimosa. Eu já havia escutado que abririam caminho por ali, mas preferia não acreditar nisso. Até que um dia eu estava em um táxi com a minha progenitora e o motorista veio a falar "posso virar a direita para cortar caminho?" E pronto. A Rua Ceará despudorizada, com a sua privacidade totalmente violada. Nesse momento tive pena ao pensar em todo tipo de frequentador da Vila Mimosa, de macacão sujo de gracha a terno e gravata, que se consideravam livres quando atravessavam debaixo do viaduto. Veja bem caro leitor, minha indignação não é só porque quem vai na encolha precisa ficar mais atento. O principal motivo se refere ao espirito underground do lugar, que não combina em nada com uma via expressa. Mas enfim, vamos em frente. Essa era apenas a primeira das invasões de privacidade que eu iria ter contato.

No dia seguinte, tinha um exercício acadêmico a fazer. Foi então que, ao ler uma crônica do Stanlislaw Ponte Preta, me deparo com a história de Gervásio. Casado com uma esposa do estilo amélia, resolve levá-la para jantar fora em comemoração a 25 anos de casamento. Sugere diversos restaurantes finos que são rejeitados, até o momento em que ela aponta para um inferninho e cisma com ele. O marido tenta fazer com que ela mude de idéia, mas os seus esforços são em vão. A partir daí a casa cai pro Gervásio, todos os funcionários o conhecem e fazem questão de tratá-lo bem oferecendo suas preferências. Outra invasão de privacidade das brabas, criando um enorme constrangimento fictício.
Na sequência eu precisava ir até o banheiro e, nesse pequeno percurso, dou de cara com um indivíduo raspando a fachada do prédio, sentado num andaime na frente da minha janela. Não achei nada agradável saber que nos próximos dias terei um espectador do meu lar. Todo cuidado com o que é dito, afinal parece uma daquelas tramas de agentes infiltrados disfarçados em um furgão de tv a cabo. Pior ainda é ser obrigado a escutar uma música entoada de forma deveras desafinada ou escutar uma reflexão sobre a mulheres do pagode, quando você só queria pegar um copo d'água.

Foi a partir daí que tudo começou a se encaixar na minha cabeça. Invasões de privacidade, Rua Ceará, pobre Gervásio, obra na minha janela... Pensei imediatamente em chamar o síndico. Devido a impossibilidade de tal feito, tive que me contentar com sua música...

(19/05/2009)

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