sábado, 26 de dezembro de 2009

A Fábula da Ilha Grande

Durante mais uma de minhas insônias, ao apreciar o meu novo pacote de tv a cabo - em pleno sábado à noite (quando tudo deveria acontecer, menos morgar em casa) - me deparo com o filme "Quase 2 irmãos". Apesar de todos os pesares que envolvem o filme em si, trata-se de uma excelente oportunidade para refletir acerca da história do crime organizado e, consequentemente, sobre a história contemporânea do nosso país.


O folclore em torno do presídio de Ilha Grande não é em vão. Lá estiveram presos de Fernando Gabeira a Madame Satã, passando por Graciliano Ramos e sem esquecer de Escadinha - e sua fantástica fuga de helicóptero. Durante a ditadura, a composição que mescalava presos políticos e comuns foi determinante para o surgimento da facção criminosa mais conhecida do Brasil, a primera de muitas que viriam.Tal interação por trás das grades representava as evidentes distâncias sócio-culturais e proximidades geográficas entre morro e asfalto.


Dessa forma, juntou-se a experiência intelectual e estratégica dos "subersivos" com a experiência criminosa diferenciada dos presos "convencionais". As causas motivadoras obviamente eram diferentes: enquanto os primeiros eram movidos por uma ideologia, os outros eram impelidos por estarem à margem da sociedade. Em comum, ambos possuíam a revolta contra o sistema opressor e as condições sub-humanas no âmbito carcerário.

E assim surge a Falange Vermelha, com resquícios de um romantismo contravensor que futuramente viria a ser pulverizado. A sua história se confunde com a história do crime organizado carioca e brasileiro. Paz, Justiça e Liberdade foram os princípios geradores que infelizmente não podem ser associados ao pé da letra quando falamos de qualquer facção criminosa. Porém, algumas características originais da falange são seguidas a risca até hoje pelos criminosos - principalmente o gerenciamento das atividades de dentro dos próprios presídios.

A intenção não é dizer que a culpa pelo avanço do tráfico vem da criação da Falange ou da Ditadura repressora. Sem dúvidas, as sementes do mal foram plantadas muito antes, decorrentes de todo histórico de opressão e injustiça social. Porém, é inegável que trata-se de uma época crucial para a compreensão do surgimento do crime organizado no país. Muitos poderosos perceberam como o profissionalismo do crime poderia ser lucrativo e, com isso, veio a concorrência. Evidentemente, o resultado veio através das disputas. A Falange virou Comando Vermelho. Surgiu o Terceiro Comando. Depois a ADA. Em São Paulo, nasceu e emergiu o PCC. E por aí vai... Todos seguindo os mesmos moldes administrativos. O resto da história todo mundo sabe e as consequências geradas todo mundo vive na pele, direta ou indiretamente. Seja como vítima e/ou cúmplice.

Nenhum comentário:

Postar um comentário